Você é capaz de superar uma desilusão amorosa?
As duas moças conversavam de pé, a 30 centímetros de mim, apertadas na Linha Vermelha do metrô de São Paulo. Foi inevitável escutar quando a mais jovem começou a reclamar que o ex-noivo não a deixa em paz.
Ela está com outro há mais de ano, apaixonada, pensando em se casar, mas o ex segue ligando, convidando para sair, visitando os pais dela, mandando mensagens apaixonadas no aniversário de namoro deles.
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"Precisei bloquear", ela disse para a amiga. "Fiquei com pena, mas não teve jeito".
Ela contou que o namorado atual é ciumento. Cada vez que lê o nome do outro no Facebook ou no Instagram, comentando ou curtindo uma imagem dela, passa dois dias emburrado, sem falar com ela.
"Já disse mil vezes ao Fulano que não há chance de a gente voltar, mas ele insiste, diz que eu sou a mulher da vida dele. Bloqueei".
As moças desceram na estação República, ainda falando sobre o caso, e eu segui viagem no vagão lotado, pensando na dificuldade que muitos de nós temos em aceitar o fim dos relacionamentos.
Às vezes, nos recusamos obstinadamente a ouvir um "não".
Nos enganamos, nos iludimos, nos colocamos em posições masoquistas e humilhantes. No final das contas, sofremos mais e por muito mais tempo do que seria necessário.
(Outra coisa em que fiquei pensando foi no namorado atual da moça, aquele que passa dias emburrado por causa de uma postagem alheia nas redes sociais. Muito equilibrado. Dá para especular que ela trocou um namoro sem paixão com um sujeito carente por um relacionamento tóxico com um camarada inseguro, mas isso é material para outra coluna).
O que faz com que as pessoas se apeguem a relacionamentos encerrados? O que as impede de aceitar a dor e seguir adiante? Por que algumas pessoas, mais do que outras, parecem incapazes de superar uma desilusão amorosa?
São perguntas difíceis, para as quais não existe uma resposta genérica. O que eu sei é que esse comportamento é tristemente comum. Já vi gente adulta, aparentemente equilibrada, definhar e enlouquecer depois de ser trocada.
Para essas pessoas — e acredito que todos nós podemos ser "essas pessoas", mediante a combinação certa de paixão e abandono – a rejeição amorosa equivale à aniquilação.
A fusão com o outro é tão profunda, a necessidade da presença dele ou dela tão absoluta, que a pessoa abandonada sucumbe.
Ela se sente mutilada de forma profunda e irreversível. Olha para si mesma e se percebe vazia, próxima da inexistência e da morte. Olha para fora e tampouco encontra esperança.
Diante desse sentimento de desamparo, o abandonado usará qualquer desculpa para se aproximar do seu antigo amor.
Procurar os pais e os amigos do ex é um clássico. Usar as antigas datas do casal para mandar mensagens é outro. Achar desculpas esfarrapadas para fazer contato ("encontrei uma meia sua na gaveta da cômoda") é igualmente comum.
Todos esses gestos de aproximação dizem exatamente a mesma coisa: "Preciso de você para voltar a me sentir vivo. Sozinho, não consigo existir".
Não acho que isso seja uma coisa de homem ou de mulher. Acontece com todo mundo. Mas, na minha experiência, as mulheres toleram melhor as perdas amorosas. Elas tendem a aceitar o que é inevitável e seguir adiante. Mostram mais pudor de invadir a vida alheia com sua dor.
Homens têm mais dificuldade em sofrer. Terceirizam a dor, culpando, agredindo ou amolando alguém. Não é uma regra, mas, tenho visto que falta a muitos homens a resignação essencial diante dos amores perdidos – e esse talvez seja um componente importante da violência contra as mulheres e da autodestrutividade masculina.
Gente incapaz de suportar a dor destrói a vida dos outros (e a sua própria) para tentar se sentir melhor.
Gente incapaz de sofrer não consegue fechar as feridas e seguir adiante.
Todo mundo sabe, ou deveria saber, que uma dose de sofrimento amoroso é inevitável. As pessoas entram e saem da nossa vida – assim como nós entramos e saímos da vida delas – e esses movimentos não são indolores.
As separações machucam, tanto quanto os encontros gratificam.
Mas isso não significa que vamos nos esfacelar a cada separação ou que nos tornaremos, para o resto da vida, sombras chorosas ou agressivas de alguém que não nos quer mais.
O ato de viver pode ser entendido como uma sucessão de apaixonamentos e despedidas. Se a gente não aprende a sobreviver a eles, fica difícil.
A dor faz parte, mas, quando ela vira a coisa mais constante da vida romântica de alguém, é hora de erguer o braço e pedir ajuda.
Talvez alguém pudesse lembrar ao noivo abandonado da moça do metrô que ninguém inventou uma receita para evitar o sofrimento pelo qual ele está passado.
O sentimento de abandono e desamparo está conosco desde o instante em que chegamos ao mundo, e deve nos seguir até o fim.
De certa forma, ele nos torna humanos.
Confrontados com a ausência dolorosa daqueles que amamos, cuja ausência não entendemos e nem aceitamos, somos obrigados a pensar, a criar e a nos interessar por outras pessoas. Crescemos.
Se não houvesse abandono – e a nossa reação a ele, cheia de vida – ainda estaríamos pendurados no peito da mãe, talvez até no interior da barriga dela, como grandes protozoários felizes.
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